SERAFIM CORREA DE BARROS — O HERÓI DE TRÊS
GUERRAS
(Firmino Costa)
Serafim nasceu em 2 de agosto de 1817 e foi batizado com mais de quatro meses, em 9 de dezembro, em Santa Maria. Não se pode afirmar, mas é quase fora de dúvidas que
Serafim teria nascido em território atual de Júlio de Castilhos, nas
proximidades de São Pedro Tujá (Abacatu). O certo é que passou toda a sua
existência na Fazenda Vista Alegre. Foi sepultado no antigo Cemitério dos
Azevedos, em Tupanciretã, junto com sua esposa Carolina e mais tarde transladado
para o cemitério da cidade.
Pouco se sabe do menino. Apenas que sua mãe, Ana Maria de
Jesus, com 22 anos, o levou a Santa Maria onde ele foi batizado. Foram
padrinhos o próprio vigário, Pe. Antônio José Lopes e sua avó materna, Vicência
Maria de São Joaquim. (Não existia ainda a Capela de São Martinho, que ficaria
mais perto).
Um fato talvez explique a presença de sua mãe em nossa
região:
Agostinho Soares da Silva, morador de Santa Maria, tinha
uma sesmaria em São Pedro Tujá. Sua mulher era tia da mãe de Albino Silveira,
com quem, a partir de 1822, ela se uniu e teve mais seis filhos, entre eles o
Fundador de Tupanciretã.
Por volta de 1835 ou 36, Serafim teria sido levado para
os campos da futura Vista Alegre. Tinha 19 anos e era chamado de Serafim José
Jacinto. Usando como sobrenome o nome do avô materno, um dos primeiro povoadores de Santa
Maria.
Só depois da Revolução Farroupilha, em 1845, ele soube que seu pai havia falecido, em 28 de agosto de 1836, em Bagé, e que tinha mais cinco
meio-irmãos. Contam que era muito parecido com o pai, físicamente e pela
maneira de falar, e foi muito bem recebido por eles.
Além de bens em território brasileiro, foram partilhados
no Uruguai as fazendas de Caraguatá e outra às margens do Jaguari. Embora
dilapidadas por 9 anos, no inventário, ainda foram encontrados 8.000 bovinos,
eqüinos, muares e ovinos.
SERAFIM E A REVOLUÇÃO FARROUPILHA — 1835 –
1945
Por volta de 1840, a tropa republicana, sob o comando de
José Gomes Portinho, com 26 anos, operava em nossa região (São
Bernardo-Tupanciretã). Serafim, com 23 anos, já entusiasmado em combater o
Governo Imperial e sentindo no peito o despontar da energia, a audácia, o valor
e a têmpera que ele trazia no sangue, resolveu acompanhá-lo.
Seu gênio militar encontra raízes no tio-avô materno, Ten.
Cel. Zeferino José Jacinto, que foi inexcedível na luta, morrendo gloriosamente
em 1839, nas proximidades de Cruz Alta e sento enterrado, como homenagem do
Presidente da República Rio-Grandense, na então capital, Caçapava.
Hábil no manejo da lança e da espada e absoluto no
domínio de seu cavalo conquistou em seguida o posto de alferes.
A primeira noticia que se tem, em outubro de 1841, como tenente
Serafim José Jacinto, foi ao encontro com um piquete do Loureiro, um comandante
missioneiro onde, apesar de contar com um número inferior de cavaleiros, leva a
guarda avançada de vencida em bela escaramuça.
Em 22 de abril de 1842, ainda como tenente, comandando 36
praças entrou nos campos do imperialista João Gonçalves Padilha, o Padilha
Rico, para uma diligência. Cai, no entanto, em uma emboscada de uma força de
mais de 60 homens de Melo Bravo.
O “valoroso e benemérito oficial”, na linguagem de
Portinho, reconhecendo a superioridade do inimigo, projetou uma retirada. A
manobra é percebida e Serafim foi perseguido. Pressentindo que seria alcançado
por cavalariano bem montados e que estava com sua cavalaria cansada pela grande
marcha da noite anterior, andou mais uma meia légua e viu-se forçado a tomar
posição e carregar sobre o inimigo que vinha a meia-rédea.
Depois de um renhido combate, com heróica bravura,
derrotou-os completamente, obrigando-os a uma desesperada fuga, deixando no
campo da batalha doze praças e dois sargentos mortos. Além de vinte cavalos
encilhados, entre os quais o do próprio Padilha que, ferido, fugiu a pé. Entre suas baixas, Serafim lamentou a morte
de apenas dois homens, um deles, seu irmão, o Alferes José Jacinto. E, entre os
feridos, oito homens e dois extraviados.
Nessa época, Serafim já havia conhecido Carolina Josefa
Leopoldina, uma moça de rara beleza, filha de um fazendeiro de uma sesmaria nas
proximidades da atual Fazenda de São Pedro do Tarumã. Num intervalo de lutas,
antes do fim da Revolução, volta à querência e casa com ela entre 1843 e 44,
indo arranchar com sua mãe numa coxilha que deu o nome de Fazenda da Vista
Alegre.
SERAFIM E A CAMPANHA DO URUGUAI — 1851-1852
Cumprindo um Tratado
de Aliança, com o Uruguai e os governos de Entre Rios e Corrientes, representado
pelo Gen. Urquiza, o Brasil é solicitado a auxiliar no combate ao ditador Gen.
Juan Manuel de Rosas.
Em junho de 1951, o Conde de Caxias, é nomeado o
comandante em chefe do Exército Nacional e reúne, em Livramento, as forças que
para ali mandara convergir e as organiza, criando o 1° Regimento de Cavalaria
da Guarda Nacional. Deu-lhe o comando do Cel. José Alves Valença (pai do nosso
Dr. Valença) e Serafim foi confirmado no posto de Capitão em 30 de agosto de
1851, com 31 anos, no comando de uma de suas Companhias. O 1° e 2° Regimento formavam
a Brigada comandada por Portinho, então com 37 anos.
O Exército Brasileiro compunha-se de 18.000 homens, 11
navios e 6 vapores ancorados na foz do Rio da Prata. Com uma única batalha, a
de Monte Caseros, em 3 de fevereiro de 1852, Rosas é derrotado e asila-se num
navio de bandeira inglesa.
Em 3 de agosto de 1852, o 1° Regimento é dissolvido no
Arenal, em Santa Maria.da Boca do Monte e, pela valentia e arrojo nas pelejas,
Serafim ganha então a “Medalha de Prata do Campanha do Uruguai” e a “Ordem
Imperial da Rosa” que lhe deu o título de Comendador e o livre acesso a palanques
oficiais e atos públicos.
SERAFIM E A GUERRA DO PARAGUAI. — 1865 -
1870
Em fevereiro de 1865, a Câmara de Cruz Alta denuncia a
presença de tropas paraguaias a 37 léguas da Vila. A presença de um paraguaio
em Campo Novo, a título de explorar minas, preocupa as autoridades com o perigo
de “tornar-se de uma hora para outra, teatro de mortandade e, sobretudo,
saques” e o Presidente da Província manda o Brigadeiro José Gomes Portinho a
Cruz Alta para organizar a 4ª Divisão de Cavalaria da Guarda Nacional para
guardar as fronteiras do município.
Portinho reúne, com dificuldade, 3.400 homens e ruma para
as margens do Paraná onde acampa.
A “Divisão Portinho” fazia parte da 5ª Brigada do Cel.
Antônio Mascarenhas de Camelo Júnior e dela fazia parte o 1° Corpo Provisório
comandado por Serafim.
A coluna de Portinho leva 25 para cruzar o Rio Paraná,
devido às fortes chuvas e falta de meios de transporte e animais. De
Encarnación, em 26 de junho de 1869, começa a triunfal incursão no território
paraguaio em direção a Yjuty, percorrendo dezesseis léguas “por caminhos quase
intransponíveis, cortados de inúmeros arroios, extensos banhados e atoleiros”.
Dia 28, o Ten. Cel. Serafim e o Mj. João da Gama Bentes
Juvenis, com 250 praças a cavalo, duas bocas de fogo e 50 infantes, entram em
Duarte-Cuê e prosseguem na vanguarda até São Miguel. O inimigo, 10 ou 12
homens, foge para os matos deixando sete cavalos encilhados.
A vanguarda brasileira, que sempre foi comandada por
Serafim, chega ao Passo de Tuty e desbarata todas as pequenas guardas
encontradas. Leva três dias para cruzar o rio que estava a campo fora, com nado
de setenta braças. Serafim passa pelo povo de Yjuty, que estava abandonado e
vai encontrar uma força inimiga de duzentos homens defendendo a boca de uma
picada. Guerrilha fortemente com ela, fazendo dois prisioneiros, três mortos e
deixando escapar alguns feridos.
A 13 de agosto, a coluna já havia transposto o rio e a
vanguarda, graças à atividade valor e intrepidez de Serafim, e chega a cinco
léguas do inimigo. No dia seguinte à distância chega a duas léguas onde estava Vernal
com 1.300 homens e três canhões, além de receber de Ascurra mais dois canhões,
um Batalhão de Infantaria e um Regimento de Cavalaria a Pé. Apesar de tão
poderoso, o inimigo depois de manter vivo fogo de fuzilaria e metralha não
resistiu à investida corajosa de Serafim flanqueando sua tropa e o inquietando
constantemente e acabou batendo em retirada.
Esta notável ação do Exército Brasileiro é descrita no jornal
“A Reforma” de 17.6.1870:
“Dia 21 de julho de 1869, o Cel. Portinho bate-se com uma
coluna paraguaia de mais ou menos dois mil homens, comandadas pelo Cel. Vernal
usando a artilharia e infantaria depois de duas horas de vivo fogo. Desbaratado
o inimigo, caiu-lhe a cavalaria em cima com todo o denodo, cabendo o mais
importante lugar entre ela ao 1° Corpo de Cavalaria do intrépido Ten. Cel.
Serafim Correa de Barros”.
Da Ordem n° 30, de Portinho ao Marechal de Exército, Conde
d´Eu, Comandante em Chefe das Forças Brasileiras em Operação no Paraguai,
transcreve-se:
“O Ten. Cel. Serafim Correa de Barros, a frente do 1°
Corpo ao seu comando, com intrepidez e galhardia, carregou por vezes sobre o
inimigo, rompendo sempre as massas e desmantelando os quadrados que procuravam
formar”.
Assim, depois de sucessivos triunfos, avançando à medida
que enfraquecia a resistência, a coluna chegou, a 5 de agosto, a Peribebui e,
pouco depois, desmorona definitivamente a força paraguaia.
Pelos serviços prestados na Campanha do Paraguai, por Decreto
de 22 de junho de 1870 da pasta da Guerra, Serafim foi promovido ao posto de
Coronel Honorário do Exército Nacional, título, aliás, que ele nunca usou.
Pelas narrativas históricas de tradicional bravura, os
brilhantes episódios das três guerras onde participou, dos notáveis feitos e das
manobras criadas por seu gênio militar, seus camaradas lhe deram o cognome de
Serafim Bravo. E, se mais instrução tivesse teria tido o título de Barão.
Serafim viveu, ainda, dezesseis anos de paz na sua
Fazenda da Vista Alegre, no Distrito de Vila Rica, sempre admirado por seus
chefes militares e gozando de justo prestígio no do Município de São Martinho.
Ali, encontrou o merecido repouso na glória eterna daqueles que ajudaram a
escrever a história da luta pela defesa e liberdade da Pátria Brasileira.
Que sejam tempos de paz os tempos que hão de vir. De
compreensão e amizade, não apenas entre todos os rio-grandenses com ideologias
diferentes. Nem somente entre nós e a nobre nação paraguaia. Mas com todas as
outras nações que envolvem o Brasil com o significativo abraço de suas posições
geográficas. Mas tempos em que, pela
intensa participação na história de nossa terra, pela valentia e arrojo, pela
virilidade de seu braço, pela energia de seus sentimentos cívicos, Serafim
Bravo viva para sempre como motivo de orgulho e admiração, na memória de seus
descendentes e da gente de nossa terra.
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